A rotina a sufocava, roubava-lhe os futuros suspiros, os desejados devaneios, o saboreio do afago no coração. Roubava-lhe além do ar, a coragem de expressar, a desenvoltura de escrever, a satisfação de amar, o direito e o querer se apaixonar, as forças para resistir.
A rotina era como um bicho apavorante, um monstro arrastando-a pelo pé, para um pântano escuro, sem calor, sem luz, sem cor, em busca de capturar não só a ela, mas principalmente seu sorriso. E onde a cada minuto, por mais que se debatesse, mais um pedaço do seu sorriso ia desaparecendo submerso ali.
Ela bem sabia que uma hora iria sair daquela situação, sabia que não eram aqueles, seus últimos instantes de vida, mas ainda assim a sensação era de morte lenta e definhante.
Ela também sabia que se esperasse um vacilo do monstro conseguiria bolar uma fuga, mas a vontade de que aquilo tudo não tivesse se iniciado a segurava numa inércia sem sentido.
Queria mesmo era nunca ter estado ali, mesmo sabendo que uma hora iria sair, queria nunca ter sentido aquelas agonias, aquelas tristezas, e a falta de ar, de coragem, de desenvoltura, de satisfação, de paixão, de forças. Mas para tanto precisaria fazer com que tudo aquilo só dependesse de si, e aquilo também depende do mundo, do sol, das cores, e dos amores.
Era com pesar que ela sentia o frio, a mágoa, o sal de suas lágrimas que já foram doces. E se tentara gritar por socorro, o pântano era longe, escondido, fechado, e quando alguém a ouvisse, o sorriso dela já poderia estar morto.
P.s.: Quando a menina gritar por socorro, é porque ela precisa mesmo, muito e de verdade, e o mais rápido possível.
Diva Brito